O voto do ministro Luiz Fux apresenta uma contradição fundamental ao validar a delação premiada de Mauro Cid, considerando-a formalmente íntegra e dotada de credibilidade. No entanto, de forma surpreendente, ele decide não aproveitar o conteúdo essencial dessas mesmas confissões para reconhecer a materialidade dos crimes e a autoria dos demais envolvidos. Essa postura selective anula na sentença o valor probatório que foi concedido ao instrumento durante o processo, gerando uma incoerência difícil de conciliar.
Outro ponto contraditório reside na questão da competência do STF. Em março, o próprio Plenário da Corte, de forma unânime e com a participação do ministro, decidiu pelo recebimento da denúncia, ato que pressupõe o reconhecimento prévio da competência para julgar a causa. Agora, ao declarar a incompetência do Tribunal, o ministro se coloca em rota de colisão com seu próprio entendimento anterior e com a decisão coletiva, sem apresentar novos elementos factuais que justifiquem tal revisão.
A seletividade na aplicação das consequências jurídicas é igualmente perplexante. O ministro condena figuras-chave como Braga Neto e o próprio delator, Mauro Cid, reconhecendo ali a existência de condutas ilícitas. Contudo, ao absolver Jair Bolsonaro, ele parece dissociar a figura do principal mandatário da época das ações executadas por sua equipe mais próxima, como se o presidente estivesse alheio a um plano articulado que ocorria dentro de seu próprio gabinete.
Essas inconsistências, tomadas em conjunto, fragilizam a robustez técnica do decisum e alimentam a percepção de que fatores externos à estrita legalidade podem ter influenciado o julgamento. O resultado é uma sensação de impunidade para a principal figura envolvida e uma sombra de insegurança jurídica sobre um caso que deveria marcar o fortalecimento das instituições democráticas.