*Jair Viana
O medo gerado pela eventual volta de Jair Bolsonaro (PL-DF) ao poder, detectado na última pesquisa Genial/Quaest, divulgada no último dia 3, remete, ressalvados alguns aspectos,ao temor histórico associado a líderes da extrema-direita como Adolf Hitler, Benito Mussolini ou Idi Amim. Enquanto figuras como Hitler e Mussolini simbolizam regimes totalitários consolidados, com genocídios e guerras mundiais em seu legado, Bolsonaro representa uma forma contemporânea de autoritarismo, marcada por uma retórica de polarização e negação de instituições democráticas e alinhamento a movimentos globalizados de ultradireita.
A pesquisa Quaest revela que 44% dos eleitores temem o retorno de Bolsonaro, ante 41% que receiam a continuidade de Lula. Esse medo não se assemelha ao pavor gerado por Hitler ou Mussolini, cujos regimes eliminaram opositores, promoveram perseguições em massa e desencadearam conflitos globais. No caso de Bolsonaro, o temor está ligado à erosão democrática, como ataques ao Judiciário, defesa de intervenções militares e negação de resultados eleitorais — padrões observados durante seu governo e após o pleito presidencial de 2022. Já Idi Amim, ditador de Uganda entre1971 e 1979, personificava um terror visceral, com execuções arbitrárias e perseguição étnica, algo distante da realidade brasileira atual.
Bolsonaro compartilha com líderes históricos da extrema-direita a exploração do medo como ferramenta política. Hitler usou o “medo do comunismo” e a humilhação pós-Primeira Guerra para ascender; Mussolini instrumentalizou a crise econômica e a desordem social. Bolsonaro, por sua vez, mobiliza o pânico moral contra minorias, a desconfiança nas instituições e a nostalgia de um passado idealizado (como a ditadura militar), estratégias que ecoam o bolsonarismo como política dos sentimentos.
Enquanto Hitler e Mussolini buscavam controle absoluto do Estado e da sociedade, Bolsonaro opera em um sistema que tensional com o Estado Democrático até seus limites, como evidenciado pelas denúncias de tentativa de golpe em 2022 . Seu método aproxima-se mais de figuras como Donald Trump ou Javier Milei, que combinam retórica antissistema com uso de redes sociais para amplificar narrativas .
O medo do eleitor em relação a Bolsonaro reflete uma ameaça à normalidade democrática. A pesquisa Quaest mostra que, mesmo inelegível até 2030, sua influência persiste: 40% dos eleitores ainda o apoiariam em um segundo turno contra Lula . Esse fenômeno lembra a resiliência de movimentos pós-fascistas, como o neofascismo italiano ou o neonazismo alemão, que sobrevivem à morte de seus líderes originais.
No entanto, diferentemente de Hitler ou Mussolini, Bolsonaro não conseguiu cooptar totalmente as Forças Armadas ou as elites econômicas. Ainda que parte do empresariado o apoiasse, setores financeiros mostraram certa resistência diante de sua instabilidade.
A articulação de Bolsonaro com a extrema-direita global (como Steve Bannon e setores do Partido Republicano nos EUA) assemelha-se às alianças transnacionais do fascismo do século XX, mas com ferramentas modernas: desinformação digital, ataques coordenados a instituições e narrativas de “perseguição política” . Seu filho, Eduardo Bolsonaro, por exemplo, repete o discurso de “ditadura” no Brasil para deslegitimar eleições, estratégia similar à usada por Trump após 2020 .
Hitler e Mussolini, por outro lado, buscavam expansão territorial e domínio ideológico direto. Bolsonaro, como Milei ou Orbán, atua dentro de uma nova direita radical que prioriza a fragmentação de consensos democráticos, não a conquista militar .
O temor gerado por Bolsonaro não equivale ao horror de regimes fascistas ou ditaduras brutais, mas sinaliza riscos específicos do século XXI: a normalização da violência política, a erosão de checks and balances e a ascensão de líderes que instrumentalizam crises para minar democracias. Enquanto Hitler e Mussolini personificavam o mal absoluto, Bolsonaro representa uma ameaça difusa, alimentada por polarização, redes sociais e uma base eleitoral que vê nele um “mito” contra o “comunismo” — categoria ampla e mal definida que inclui desde o PT até direitos LGBTQIA+ .
A pesquisa Quaest, ao revelar que o medo de Bolsonaro supera ligeiramente o de Lula, indica que o fantasma do autoritarismo ainda assombra o Brasil, mesmo que de forma menos explícita que em outros contextos históricos. Combater esse medo exige não apenas memória dos horrores do passado, mas vigilância contra as novas formas de extremismo que se infiltram nas brechas das democracias contemporâneas.
_*É jornalista e editor de Brasil 24h