O vereador Bruno Moura (PRD) de São José do Rio Preto, interior paulista, apresentou um projeto de lei que promete resolver o problema da população em situação de rua com uma solução inovadora: tirar a rua desses moradores; proibi-los de dormir na rua. Sim, a proposta mira justamente o único teto que essas pessoas possuem – o céu aberto sobre calçadas e praças. O vereador quer impor o que se pode chamar de “despejo” do morador de rua.
O parlamentar argumenta que a proibição de barracas, sofás, camas e “toda estrutura que consolida forma de moradia” em áreas públicas visa incentivar que as pessoas busquem “acolhimento e devidos encaminhamentos”. A ironia, contudo, salta aos olhos: como buscar abrigo se a rede existente, como o Centro Pop, é sabidamente insuficiente para a demanda? O projeto, silencioso nesse ponto crucial, não oferece novas vagas, ampliação de serviços ou recursos adicionais. A solução aparente é simplesmente tornar a sobrevivência ao relento ainda mais impossível. É preciso lembrar que o município não é dono do céu.
A justificativa para o desmonte dos

frágeis abrigos improvisados recai sobre a associação automática entre presença de barracas e “núcleos de usuários de drogas”, considerada “inadmissível” pelo vereador. A fiscalização ficaria a cargo de agentes de postura e da Guarda Civil Metropolitana (GCM), com remoção dos pertences. A pergunta que não quer calar: para onde irão essas pessoas depois que seus parcos pertences forem confiscados? Os pertences dessas pessoas, como de qualquer outra, só se fazem com mandado judicial e unicamente pelo poder de polícia.
Mas o vereador não para por aí. Sua segunda proposta, batizada de “Programa de Retorno Assistido”, completa o quadro. Baseado na premissa de que “muitos não são originários” da cidade e não têm laços locais, o plano é “identificar” a cidade de origem e fornecer passagens de ônibus para um retorno “assistido”. A ideia, apresentada como um gesto de reinserção familiar, ignora perguntas fundamentais: E se a pessoa não quiser ou não puder voltar? E se os laços familiares foram rompidos por violência ou abandono? E se não houver acolhimento ou estrutura na cidade de origem? O projeto, na prática, soa como uma elegante deportação municipal, transferindo o problema para outra localidade sob o rótulo de “assistência”.
Quando questionado sobre o método para obter informações sobre a origem das pessoas, inclusive sobre a possibilidade de a GCM “apertar” os moradores – como sugerido por ex-gestor da Assistência Social, o coronel Frederico –, o vereador evitou uma condenação clara. Limitou-se a afirmar que “não é apertar”, mas sim “encarar com seriedade” o fenômeno, alegando que o direito à segurança não pode ser ferido pela situação de rua. O direito constitucional de ir e vir, e principalmente o de existir em algum lugar, parece ter sido convenientemente esquecido na equação.
Em resumo, a proposta do vereador Bruno Moura se resume a uma operação de limpeza urbana disfarçada de política social. Tira-se o pouco abrigo precário que os sem-teto conseguem erguer, sem lhes dar alternativas viáveis dentro da cidade. Oferece-se, generosamente, um ônibus só de ida para um destino incerto. Tudo em nome da ordem, da segurança e da “proteção da população”, exceto, claro, da proteção daqueles que mais precisam: os que têm apenas a rua como endereço. A solução encontrada é, no fundo, a mais antiga: tornar invisível a miséria, seja confiscando barracas, seja embarcando pessoas. O problema, convenientemente, deixa de ser visto – mesmo que continue existindo.
Para finalizar, é preciso lembrar que o órgão estatal não tem procuração do Criador para decidir quem pode ou não pode se abrigar sob o teto celeste.